domingo, 27 de fevereiro de 2011

moacyr scliar

Moacyr Scliar era tão presente no nosso dia-a-dia - com suas crônicas, contos e livros - que é difícil admitir que de fato ele se foi. Como disse a Lya Luft hoje, na Assembleia, se, por um lado, enquanto escritor, ele fará falta porque não vai produzir novos livros, por outro, o que ele deixou permanece.

Lembro de uma entrevista em que ele falava sobre como escrevia rápido e o tempo todo: não poderia ser diferente, dada a quantidade de textos que produziu. Mais de 70 livros em 73 anos. 

O que todos destacaram, no entanto, hoje, durante o velório, foram os aspectos humanos do escritor:

“Era, principalmente, uma pessoa boníssima, suave, que faz muita falta nesses dias tumultuados de hoje”. Martha Medeiros
 
"Um sujeito reto, honrado, bondoso, fraterno, simples. As glórias nunca lhe subiram à cabeça". Lya Luft

"A vida literária é muito dura, muito cheia de vaidades, de ódios, invejas, mas ele nunca se deixou contaminar por isso. A palavra dele sempre foi uma palavra de afeto". Assis Brasil

"Uma pessoa muito especial, um grande escritor, conhecido internacionalmente, mas para os amigos sempre foi o mesmo". Célia Ribeiro

"Muito amigo dos amigos, generoso, além do talento que tinha como escritor". Luis Fernando Verissimo

"Um ser humano completo". Paulo Sant'Ana

*


Eu estava de plantão no fim de semana, ou seja, devia publicar no site da AL algumas matérias pré-prontas e estar a postos caso ocorresse alguma emergência.

Domingo, levantei às sete e meia e encontrei um filhote de lagartixa no banheiro. Levei um susto,  achei melhor ignorá-lo. A gente aprende desde cedo que não se mata lagartixa. Elas são do bem, comem insetos. E, além disso: como se mata uma lagartixa? Não é que nem barata, que uma chinelada resolve. Lagartixas perdem a cauda, se regeneram, escapam pela parede. Mas eu devia ter adivinhado: dias cheios geralmente vêm com algum sinal.

Liguei o computador e fiquei sabendo do ocorrido. Mandei uma mensagem de celular pra chefa (pois é, não tenho nada contra "chefa" e "presidenta" em ambientes informais, só não acho que esta devesse ser a forma oficial a se adotar). Ela já estava sabendo e ficou de me dizer o que fazer mais tarde. Fui correr na rua levando o celular. Quando voltei, entrei no banheiro pra tomar banho e - agora sim, nojo! - encontrei uma barata! Nunca antes na história do meu apartamento eu tinha encontrado uma barata!

Peguei um chinelo e a liquidei, sem delongas. Mas esse desgosto duplo me fez reparar com atenção redobrada nos rejuntes do box. O banheiro é novo, minha auxiliar doméstica é ótima, já contei, mas havia fungo nos rejuntes. Peguei esponja, bombril, sabão e me lancei à cruzada de eliminar todo e qualquer ser vivo do recinto.

Falei em "sinal", mas, reconheço: nada disso tem a ver com o que veio a seguir, exceto pelo fato de que o dia começou de um jeito estranho - um sol lindo lá fora, e, dentro, fungos, lagartixa e barata - e continuou de um jeito estranho - as mortes de um político e de um imortal, um velório no lugar de trabalho e o desfile da intelligentzia gaúcha acompanhado pela imprensa.

Sem diminuir a importância do evento, achei que faríamos uma cobertura discreta. Mas não, o chefo (sejamos coerentes: chefa, chefo :-) queria flashes. Foi tudo um tanto surreal para mim (velórios já são surreais por natureza): o ambiente solene, o zunzunzum, eu ali trabalhando e aquela revolta íntima com esse nosso destino geral.

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