terça-feira, 28 de abril de 2009

Schopenhauer e a arte de escrever

Há horas venho tentando ler um livro de Schopenhauer, A arte de escrever. Leitura fácil, leve, mas não tem jeito: cada vez que o pego, releio o prefácio, começo o primeiro capítulo, me ponho a divagar e acabo deixando-o de lado. Talvez porque já nas primeiras páginas o autor assim se pronuncie sobre quem lê demais: “Ah, essa pessoa deve ter pensado muito pouco para poder ter lido tanto!”. E, a respeito de Plínio, o Velho (Gaius Plinius Secundus, almirante romano, escritor e naturalista clássico): “sinto a necessidade de me perguntar se o homem tinha tanta falta de pensamentos próprios que era preciso um afluxo contínuo de pensamentos alheios, como é preciso dar a quem sofre de tuberculose um caldo para manter a sua vida”.

Schopenhauer identifica como principais problemas estilísticos do seu tempo a falta de clareza, a prolixidade e os neologismos, que dariam aparência erudita e profunda a textos sem conteúdo. Segundo ele, esses textos se caracterizam por sentenças curtas, ambíguas e paradoxais, que parecem significar muito mais do que dizem; por uma torrente de palavras, com a mais insuportável prolixidade; ou pelo estilo científico e profundo, no qual o leitor é martirizado pelo efeito narcótico de períodos longos e enviesados. Exemplificando cada um desses estilos, ele cita respectivamente Schelling, Fichte e os hegelianos em geral e complementa afirmando que a ininteligibilidade, artifício dos maus escritores, foi introduzida na Alemanha por Fichte, aperfeiçoada por Schelling e mais ainda por Hegel.

Tudo isso está no prefácio.

Dia desses, eu estava cobrindo uma audiência pública na AL sobre a possibilidade de extinção do Tribunal de Justiça Militar (TJM) quando o desembargador presidente do Tribunal de Justiça, ao qual o TJM é vinculado, citou Schopenhauer: “Quando não se tem razão, desvia-se o assunto”. Estava se referindo à declaração do presidente do TJM de que o fim deste implicaria o fim da Brigada Militar, que “se assenta na disciplina e na hierarquia”. Não sei quem tinha razão. Só sei que o presidente do TJM gritava tanto que não consegui entender direito o que dizia. E o presidente do TJ falava com voz calma e serena, citando Schopenhauer. Claro, não era o TJ que estava ameaçado de extinção. Mas a argumentação desapaixonada soou melhor aos meus ouvidos.

Acho sempre difícil saber onde está verdade. E me impressiono com quem a encontra rápido. Eu caminho para um lado... pro outro... e termino ainda mais confusa do que cheguei. A ignorância não tem limites, a sabedoria sim. Porém, como jornalista, mesmo enxergando só um pedacinho do iceberg, é preciso sair correndo e escrever o que se vê. Felizmente não preciso decidir nada. Basta relatar o que disse um, o que disse outro, o que disseram os deputados... O povo se deixa de fora, não dá pra contemplar a todos. A não ser que seja algo muito importante (geralmente não é). Quem decide o que é importante? Bem...

Taí. Me contradisse toda :-)

***


Gastei um bom tempo desenhando um novo topo no Photoshop. De fuxicos, em homenagem à minha mãe. Pode ser que ele não esteja aparecendo, porque os topos anteriores permanecem. Agora são três, que vão se alternando, aleatoriamente. Quer dizer, "aleatoriamente" é modo de dizer, nada é aleatório em informática.

14 comentários:

  1. Teria a dizer o seguinte:

    Schopenhauer é legal!

    Tenho um livro dele.

    E li.

    Não é mais verdade. O livro que tinha dele, dei pra ti. Que não leu, mas te serve como instrumento de ativação dos pensamentos próprios. Então está cumprindo a função primordial. Vais descobrir isso quando passar do prefácio :-)

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  2. Oi, Fabrício. Tu deve tê-lo dado a outra, o meu fui eu que comprei.

    E passei do prefácio - mas não do primeiro capítulo! Tem tempo... ;)

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  3. Comigo o livro não tá...que eu lembre.
    Gostei do topo dos fuxicos. Vou colocar a mãe na frente do computador pra vê-los.

    Gostei do texto.

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  4. Fui na estante. Está lá. Pensei que era o meu porque vocês tinham levado um monte de livros aqui de casa quando fiz a limpa na estante e não imaginava que mais alguém compraria um livro do Schopenhauer.

    Como dizemos em meu grupo de amigos, Great Minds Think Alike.

    Então só tenho uma coisa a dizer:

    Schopenhauer é legal!

    Tenho um livro dele.

    E li.

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  5. Quero muito ler esse livro! É seu?
    bj

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  6. Bem, descoberto o paradeiro do livro, que droga, podia ter comprado outro :)

    Mir, que bom que gostou. E a mãe, o que achou?

    Vanessa, te empresto tu quando quiser. Tem te deparado com discursos vazios em algum lugar? :)
    Tô com um livro teu, tu sabe (O filho eterno)

    Beijos

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  7. É uma tristeza, mas o segundo parágrafo vale para todas as épocas.

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  8. E... não li esse livro, mas gostaria de pensar que Schopenhauer e Plínio, quando falam da não necessidade de ler, se referem a obras científicas (incluídas, e sobretudo, as das chamadas Ciências Humanas), e não à literatura...

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  9. Já leu Ecce Homo?

    Desse eu não consigo passar... do índice! :)

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  10. Oi, Roger! Como afirmei, minha leitura foi um tanto insuficiente, mas está claro que o próprio Schopenhauer leu por demais na vida e que isso é bom, desde que não se abdique da reflexão. Vai da capacidade de cada um absorver e processar a informação que recebe, né... :-)

    Quando fala em excesso de erudição, ele também está se referindo à ânsia por novidades (qualquer novidade) no lugar de se buscar primeiro os clássicos.

    Não li Ecce Homo. Mas, na semana passada, quando eu estava meio em crise por conta do "quanto e porquê me expor" e do "ter ou não ter um blog" (que é a ponta de um questionamento maior do tipo "quem sabe vou procurar algo mais útil pra fazer em vez de desenhar caracóis?"), minha irmã me veio com uma frase de Nietzsche, que aproveito para colar aqui:

    "O que é ser livre? É não ter vergonha de ser quem somos."

    Tinha bastante vergonha de tudo - do que pensava, do que escrevia, do que falava -, mas, felizmente, isso diminui com a idade (se nos empenharmos!).

    :-)

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  11. E, coincidência ou não, eu tenho o Ecce Homo.
    Fabricio: a gente não "levou" teus livros, tu nos deu...:P sem volta!!!

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  12. Preciso ler esse livro logo.

    Tá muito bonitinho teu blog. Caso tenha tempo, mude o link do meu. O Velho Pituca morreu ano passado agora só www.mauropaz.com.br

    Beijo.

    Saudade.

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  13. Ó, que linda estrelinha tu recebeu.

    Obrigada, Mauro, estou arrumando o link e amanhã passo no teu blog pra conferir o que tu anda aprontando por aí (agora tá tarde)!!.

    Beijo!

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